quinta-feira, 11 de outubro de 2012

O médico e o paciente em fase terminal da vida

Por Hélio Moreira | Gastroenterologista e acadêmico da Academia Goiana de Medicina
Na minha vida de profissional da medicina tenho tido a oportunidade de enfrentar uma variada gama de situações que envolvem o conflito existencial, porém a mais dramática de todas elas é a constatação de que estamos lidando com um paciente em fase terminal da vida. Não existe nada mais angustiante para o profissional que carrega o estigma de ser capaz de curar as doenças ou, pelo menos, prolongar ao máximo possível a vida, sentir que a sua arte atingiu o limite da capacidade e nada mais pode fazer.

Os pacientes, na maioria das vezes, costumam vislumbrar na figura do médico um super-homem capaz de resolver todos os seus problemas de saúde, inclusive seus conflitos emocionais, não aceitando, como resposta aos seus reclamos, a constatação da incapacidade miraculosa.

A medicina tem conseguido, ano após ano, prolongar cada vez mais a vida do homem, porém existe um limite que escapa aos bons propósitos da ciência e do profissional, por mais que se utilize dos modernos e sofisticados recursos, quer sejam medicamentosos ou instrumentais, de diagnóstico e de tratamento.

A não aceitação deste limite muitas vezes provoca confronto e discussões, com quebra do elo de confiança que existia entre as partes; entendemos como natural esta situação, mesmo porque, seria inadmissível que qualquer pessoa aceitasse, placidamente, que não existem mais recursos materiais capazes de reverter o quadro do seu ente querido.

É claro que esta situação não é a regra aqui no Brasil; felizmente, a maioria dos casos que atingem este plano inclinado, é sempre precedida por um bom ou mesmo ótimo relacionamento médico-paciente-família.

Tenho observado que nos Estados Unidos da América do Norte as coisas não acontecem desta maneira; existe um grande distanciamento entre o médico, o paciente e a sua família; nossos colegas do norte nos informam que a principal razão deste distanciamento é a desconfiança mútua; os médicos estão acossados pelos constantes processos judiciais e o paciente envolvido pelo clima de desconfiança provocado, justamente, pelo afastamento do médico da sua cabeceira.
Se os médicos americanos não expõem, como é rotina para eles já na primeira consulta, todas as suas limitações (da medicina), correm o risco de serem processados por incúria profissional se a evolução não é a esperada ou desejada; como corolário desta premissa, procuram guardar distância do paciente e principalmente da sua família.

O médico americano jamais informa o número do seu telefone ao paciente! Não fazem o que fazemos aqui: “levamos nossos pacientes que estão internados para dormirem em nossas casas”.

Existem estudos mostrando, claramente, que naqueles casos em que o médico envolveu-se, psicologicamente falando, de maneira mais afetiva com o paciente quando das consultas, levam os pacientes a entenderem melhor sua condição de paciente terminal, até mesmo aceitá-la, com menor ansiedade quanto às incertezas do futuro; às vezes, se o médico dissesse simplesmente “Eu sei que você está passando por um momento de grande dificuldade”, seria o suficiente para o paciente sentir-se amparado.

Há que se considerar o fato de que os médicos sentem-se, também, vulneráveis perante a situação de ter que discutir sobre a vida e a morte, especialmente nos casos em que a discussão está centrada em um indivíduo portador de câncer em fase adiantada da doença, coincidentemente, pertencente ao mesmo grupo etário que ele.

Revista da Academia Goiana de Medicina, outubro de 2012.


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