quarta-feira, 11 de julho de 2012

Hobby sobre duas rodas

   
PEDRO MARCELO NEIVA PINHEIRO gosta de passear por cidades próximas a Goiânia
HÉLIO FINOTTI considera andar de moto um excelente meio de viajar e apreciar a paisagem
WANDER DOS SANTOS ANJO sentirá falta de andar de moto quando for para o céu

ADILSON USIER LEITE declara que o motociclismo é sinônimo de liberdade
Uma das características que identificam estes quatro profissionais da saúde é sua paixão declarada por motos, cultivada com afinco por todos eles 

Dois urologistas, um neuropediatra e um administrador hospitalar. Aparentemente, o que eles têm em comum é o fato de desenvolver funções ligadas à saúde humana. Mas não é apenas isso. Eles têm outra afinidade: a paixão por motos custom, aquelas super motos de viagem, objeto de desejo dos amantes da liberdade dos cabelos ao vento.

O urologista Pedro Marcelo Neiva Pinheiro conta que quando criança adorava bicicleta e o melhor presente que recebeu em toda sua vida foi quando ganhou uma como recompensa pelo desempenho nos estudos. “Eu passei a gostar de todas as sensações que andar sobre duas rodas permite”, analisa. A bicicleta também foi a principal diversão na infância do neuropediatra Wander dos Santos Anjo, nascido em Uberaba (MG). “Meu pai tinha me dado uma bicicleta alemã, chamada Orca, e aquilo era a minha vida”, recorda-se. “Eu era bem menino e não tinha nem documento quando meu pai comprou uma moto chamada Java, da Tchecoslováquia, era uma ‘motorcicleta’.” diverte-se. “Depois vieram a lambreta, a vespa e a Suzuki. Em seguida a Honda 125, a TT, e a Honda de 400 cilindradas. Foi só melhorando”, constata.

O também urologista e coronel do Corpo de Bombeiros Hélio Finotti diz que seu interesse por motos data de 1982, quando iniciou sua residência em Urologia. “Nesta época, poucas pessoas tinham esse hábito de andar de moto. Não era usual o capacete, mas eu usava por medos dos acidentes e de suas consequências”, recorda-se. Em 1984 abandonou o hábito, mas o retomou em 2000, depois de ir a um encontro de motos em Goiânia. “Comprei uma moto nova e passei a fazer parte de um grupo de viagem, o Motoclube Papa-léguas”, declara. Atualmente ele tem uma moto Suzuki Boulevard 800.
Já o administrador do Instituto de Neurologia de Goiânia Adilson Usier elesLeite, que é paulista de Mogi das Cruzes, deve à família sua paixão por motos. O pai, irmãos e vários primos praticavam o motociclismo em montanha e estradas de terra. Com 14 anos, em 1964, ganhou a primeira moto e com 18 comprou uma MW 650 e passou a viajar. “Íamos bastante para o Rio de Janeiro, Bertioga, Guarujá, Campos do Jordão. Viajávamos sempre em grupo, mas na época não existia motoclubes”, esclarece.

Pedro Marcelo também tem lembranças juvenis marcantes relacionadas a motos. Quando criança viajava para um sítio da família em Pirenópolis e, ao passar pelo posto da Polícia Rodoviária Federal, onde havia uma moto da marca Harley Davidson estacionada, ele diz que se sentia atraído de uma forma impressionante e sempre pedia ao pai que parasse para poder olhá-la de perto. “Há uns cinco anos voltei a andar de moto por opção. Comecei com motos menores e, no ano passado, quando fiz 50 anos, me presenteei com uma Harley Davidson. Me apaixonei pela moto, comprei e depois, pesquisando na Internet, descobri que, coincidentemente, é do mesmo modelo, idêntica à que a Polícia Federal tinha quando eu era criança. Ficou no subconsciente”, salienta.

Na época da faculdade Pedro Marcelo diz que sentia muita vontade de ter uma motocicleta, mas o sonho não foi realizado porque sua mãe temia os riscos. Inclusive, ela se antecipou e o ajudou a adquirir um carro para que desistisse da moto. Como todo jovem costuma fazer, ele encontrou um meio de driblar o temor materno e tomava emprestado de um colega uma moto CG 125. “Eu ia dar aula de inglês em um colégio e quando eu chegava nessa moto percebia que era diferente, e era gostoso chamar a atenção, sobretudo das garotas”, se diverte.

AVENTURAS
Um dos prazeres desses motociclistas está relacionado a viagens. Hélio Finotti cita Recife e Foz do Iguaçu como as viagens mais longas que já fez no lombo de uma moto. Adilson diz que a viagem mais espetacular que fez foi para o Chile, de 15 mil quilômetros, quando passaram 22 dias viajando. “A gente fez uma programação, mas acabou não cumprindo porque durante a viagem algumas pessoas hospitaleiras convidaram a gente para dormir na casa delas e no final da viagem não se cumpriu quase nada do planejado, mas deu tudo certo”, destaca. Ele fala ainda da viagem que fez ao Nordeste, quando conheceu grande parte do litoral nordestino.

Wander considera como a mais marcante uma viagem feita no ano passado ao famoso Daytona, o maior encontro de motociclistas do planeta, sediado em Melbourne, nos EUA. “Se os jornais não exageraram havia 600 mil motos. E o melhor é que foi a comemoração dos 70 anos de Daytona e eu festejei os meus 70 anos lá também. Chegamos, minha esposa, eu e um grande grupo de amigos, no dia 26 de abril e no dia 5 de maio era meu aniversário”, diz com a voz carregada de emoção. “E aí eu me vi lá no meio de motociclistas de 80, 85 anos e me achei um menino, com 70”, brinca.

E para essas ocasiões, todos gostam de se vestir a caráter. “A gente deixa a seriedade do trabalho, bota uma roupa incrementada. Tenho até umas luvas com desenhos que imitam tatuagem”, destaca, aos risos, Pedro Marcelo, que partilha o hobby com a esposa, a advogada Christiane Caldas Pinheiro, companhia constante nos passeios. Adilson também tem a companhia da esposa, a professora universitária Vanusa Claudete Leite, em todas as viagens. Inclusive, nas constantes idas e vindas de São Paulo, onde têm filhos e netos, os dois utilizam apenas a moto Honda Gold Wing — motor 1.800 cilindradas e triciclo câmbio automático motor 1.600 cilindradas, super equipados.

Wander também conta com a companhia da esposa, a decoradora Ângela, que é quem pilota o triciclo de duas mil cilindradas do casal. Mas nem sempre foi assim. “Eu sempre tive moto, depois, por causa de acidentes, a minha mulher e as filhas pediram para eu parar. Aí fiquei quase 10 anos sem ter a minha moto e ficava andando na de colegas, morria de vergonha”, admite Wander. “Quando fiz 60 anos, comprei uma moto, cheguei em casa, chamei a minha esposa e disse: você escolhe, se você quer ser o “piolho” (é assim que chamamos quem anda na garupa) porque eu vou ficar com a moto”, conta ele, enfatizando que foi uma atitude maluca de quem tem 60 anos e acha que é menino.

No entanto, Ângela aceitou a intransigência do marido e no dia 28 de julho completam-se 58 anos que eles se conhecem. “Ela tem 68 anos e eu tenho 71, ela tinha 12 anos e eu tinha 15 quando começamos a namorar. A Ângela é minha companheira, cúmplice, maravilhosa”, derrete-se. “E me tolerar não é fácil, porque sou uma pessoa difícil e ela me aceita”, reconhece o médico, que já sofreu um infarto, do qual lhe restaram sete pontes de safenas como lembrança, e sobreviveu a um acidente gravíssimo.

“QUEM JÁ CAIU E QUEM AINDA VAI CAIR”

Wander conta que estavam em três motociclista indo para o Chuí, no Rio Grande do Sul, e quando chegavam em Santa Vitória do Palmar, um carro lhe deu um totó (é a expressão usada quando um carro bate na traseira de uma moto), e a moto capotou, provocando algumas fraturas. Trazido para casa de avião, teve que se submeter a cirurgias e colocar parafusos na perna. “Os acidentes fazem parte da história de quem anda de moto. Eu já caí várias vezes. Quem anda de moto faz parte de dois grupos: os que já caíram e os que ainda vão cair, não tem jeito”, define.

Adilson também tem no histórico de motociclista sua cota de sofrimento. Em 1999 ele e a esposa estavam voltando de São Paulo – onde vão pelo menos duas vezes ao ano para visitar filhos e netos – e, devido às más condições da BR 153, decidiram passar por Buriti Alegre. Quatro quilômetros depois se depararam com cerca de 600 vacas que estavam sendo transferidas de pasto pelo dono da fazenda. Ele perdeu o controle do veículo e atropelou uma vaca, o que acarretou nele uma lesão no crânio, fraturas na clavícula, em quatro costelas, em duas regiões de uma das pernas e em um dos dedos da mão. Vanusa fraturou alguns dedos das mãos, a clavícula e um prendedor de cabelos, que estava colocado na cinta porque não cabia no capacete, entrou no estômago dela. “Foi um estrago grande. Passamos por algumas cirurgias”, declara Adilson, contando que havia se mudado para Goiânia em 1998 para administrar o Instituto de Neurologia de Goiânia e isso aconteceu no dia 5 de setembro de 1999.

Ledo engano de quem pensa que isso fez com que o administrador e a esposa ficassem com temor de um outro acidente. “No dia 20 de dezembro do mesmo ano já voltamos para São Paulo na mesma moto para passar o Natal com meus filhos e netos. Acidentes acontecem”, pondera. Inclusive, ao conceder esta entrevista, Adilson e Vanusa estavam de viagem marcada para o dia 5 de julho com destino a Campos do Jordão e Parati.

Hélio Finotti, que usa de muita prudência ao pilotar sua moto, comenta que sofreu apenas um acidente um pouco mais grave, numa viagem a Maceió, quando fraturou um braço e precisou se submeter a uma cirurgia. Apesar de ter sido necessário deixar a moto na capital alagoana, retornar de avião e depois providenciar o transporte da moto, o urologia não se lamenta, já que considera o hobby um de seus grandes prazeres. “Eu não tenho outro vício, não bebo, não fumo, não faço qualquer outra coisa do estilo, então o custo compensa”, relativiza. Pedro Marcelo faz parte do grupo que ainda não caiu.

Revista Medicina em Goiás, junho de 2012.

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